Tag: Amizade

Histórias da praia 3 – Uma Dominique se descobrindo no Rio Chico

Dominique - PraiaComo disse no primeiro texto sobre as histórias da praia, uma das melhores coisas da minha praia são os papos, os causos, as histórias. Lembra que falei no segundo texto da Marianne que andava de manhã cedinho roubando minha exclusividade?

Bom, fato é que nos tornamos boas amigas de temporada, quer dizer, só nos encontramos lá. E só batemos papos daqueles de lavar a alma de vez em quando.

E foi isso que aconteceu semana passada.

Nos encontramos no fim da tarde para um daqueles famosos cafezinhos.

Papo vai, papo vem, disse que nunca mais a tinha visto com sua câmera fotográfica. Companheira inseparável.

Ela falou que tinha dado um tempo. Não sabia bem porque. Mas tinha aposentado dentro de uma gaveta. Máquina, lentes e parafernálias.

– Sabe? O digital facilitou muito, mas me fez perder o tesão. Esse negócio de poder tirar muitas fotos para poder escolher a melhor tirou a beleza das fotos na minha opinião.

– Mas porque Marianne? É uma enorme facilidade.

– Porque o custo da revelação impedia que tirássemos esse monte de fotos. Quando fotografamos, o que importa é a primeira, é o nosso olhar naquele momento, é o que capturamos, é o que aquilo nos fez sentir. Aí vem o momento da revelação, sendo que na maioria das vezes já tinha até esquecido de algumas fotos. E aparece a delícia de descobrir aquele registro. Bem, posso ser anacrônica ou saudosista, mas acho que não tem mais a mesma graça.

E aí ela começou a contar como foi o processo dela de descoberta pela paixão pela fotografia.

Por volta dos 50 anos, (affff sempre por aí, né Dominiques?) ela quis fazer algo que fosse só dela, só para ela e que a libertasse um pouco dos papéis de mãe filha, esposa, profissional. Estava se sentindo oprimida nessa casca.

Ahhh Mariane, como eu te entendo.

A história de seu desenvolvimento como fotógrafa, eu vou pedir para ela contar pessoalmente.

Foi fazer cursos com feras. Cursos que precisava ser aceita. Mas como assim? Nunca fotografei. Como farei um teste? Well, ela foi aceita, porque sempre teve e sempre terá o espírito do artista. O olhar diferenciado.

E assim passaram-se anos fotografando e estudando.

Até que surgiu a dúvida. Mas o que é que eu fotografo?

Para que eu fotografo?

Sou mais uma fotógrafa de por do sol de Insta?

E resolveu realizar um antigo sonho. Conhecer e fotografar o Rio São Francisco.

Mas precisava fazer isso sozinha.

Precisava deste tempo. Precisava deste encontro com ela mesma.

Fez seu roteiro.

Colega, sério, eu jamais teria encarado essa viagem. Roots demais para meu estilo.

Mas Marianne, na época com 54 anos, partiu decidida de avião até Aracajú. De Aracajú, 5 horas de ônibus até Penedo. E de Penedo mais 6 horas de ônibus até Piranhas.

Você já ouviu falar de Piranhas? Pois é eu nuuuunca tinha ouvido falar.

Mas a descrição de Ma foi de dar água na boca.

Uma cidade muito organizada, com casinhas coloridas, ruas de paralelepípedos, às margens do Velho Chico, mas ainda cheia de grutas e com histórias riquíssimas sobre o cangaço, afinal lá foi feita a emboscada final para maria Bonita e lampião. N-U-N-C-A poderia imaginar. Afff! Quanta ignorância!

Mas voltando. Ma hospedou-se numa pousada, simples e acolhedora. Estamos falando de 2005. Muita coisa deve ter mudado de lá pra cá.

Mas lá vai ela fotografar e procurar sua essência.

Até que numa certa sexta-feira, Marianne começa a passar mal. Tontura, dor de cabeça, vómitos e febre.

– Ah!  Já já passa. Vou ficar quietinha no quarto hoje.

Aí começa a diarreia. Na madrugada de sexta para sábado percebe que a coisa só piora.

Que está sozinha, no meio de lugar desconhecido sem conhecidos.

O que adiantava ligar para família naquela altura? 4 horas de avião mais 11 horas de estrada?

Arrastou-se até a entrada da pousada, chamou a dona, que muito solicita, a levou ao hospital da cidade.

Para uma paulistana, chamar aquilo de hospital não parecia apropriado. Pela falta de equipamentos e tamanho, mais lhe parecia um posto de saúde.

Foi quando apareceu um médico.

Não. Ele não estava de branco. Não, ele não tinha cara de experiente.

Mas ela estava desmaiada. Oscilava momentos de lucidez com apagões totais.

Soro na veia e internação.

Internação??? Sozinha?

Não tinha jeito. Na verdade, quase agradeceu ter alguém, para cuidar dela.

Mas não deixava de estar com medo.

O médico acalmou-lhe. Disse que tudo ficaria bem. E falou que faria uma acupuntura nela.

Sua primeira reação?? Não! Acupuntura não? E as agulhas?

O médico sorriu complacente e pediu mais uma vez que ela não se preocupasse. Apenas que descansasse.

Bem, Marianne não tinha o que fazer. Estava entregue. Nas mãos daquele Doutor. Já tinha sido indelicada o suficiente. E tinha que acreditar nele.

E assim passou o sábado. Entre soros e agulhas. Entre pequenos apagões. Acordada se sentia num sonho. coisa estranha.

Mas passou. E veio o domingo. Que continuaria internada se recuperando. Embora já sentisse melhor. Bem melhor. Já tinha até fome!

Conseguiu sentar na cama e ver que estava numa enfermaria com outros dois pacientes. Tudo muito simples, mas muito limpo e organizado.

Ainda se sentia fraca demais. Mas já conseguia pensar. Bateu-lhe uma enorme tristeza.

Pela primeira vez sentiu-se sozinha e repensando se aquela tinha sido uma boa decisão mesmo.

Será que não tinha a capacidade de viver aquela experiência?

Quanto mais pensava, mais triste ficava.

Mas de repente, entra uma pessoa no quarto. Um estranho. Um senhor.

Cumprimenta-a. Pergunta se ela precisa de algo. Segura em sua mão. Vai buscar sua refeição na copa. Não… Não era ninguém do hospital.

Ele sai e chega uma senhora, trazendo uma santinha para presentear-lhe. Senta na beira da cama. Olha em seus olhos. Passa mão em seus cabelos. Oferece-se para ligar para família. Pergunta seu nome. E foi assim todo o domingo.

Ela viu que não era só com ela, mas também com os dois outros pacientes.

Na verdade, aquelas pessoas tiravam o domingo para consolar, ajudar, conversar, fazer companhia aos doentes e principalmente estranhos. Sabiam que eram pessoas que estavam precisando de conforto. E que uma palavra e um carinho poderiam fazer a diferença.

Neste momento, Ma começa a chorar e disse que nunca mais foi a mesma. A certeza de que precisamos de muito, muito pouco, para viver. Que existem sim pessoas que fazem o bem pelo bem.

Acredito. Acredito nela. Porque a Nanny é tudo isso.

Uma emocionante história de praia não acha?

Leia Mais:

Histórias da Praia 1 – Amigas na reunião de condomínio
Histórias da praia 2 – Ela e seus deliciosos segredos

Eliane Cury Nahas

Economista, trabalha com tecnologia digital desde 2001. Descobriu o gosto pela escrita quando se viu Dominique. Na verdade Dominique obrigou Eliane a escrever. Hoje ela não sabe se a economista conseguirá ter minutos de sossego sem a contadora de histórias a atormentá-la.

4 Comentários
  1. Bom dia. Não tem continuação? Curiosa pra saber cm foram os dias que Ma passou em piranhas, o que ela sentiu fotografando o rio…

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Contar amigos é o mesmo que contar com amigos?

Dominique - Amizade

Quantos amigos alguém pode ter? Sempre estranhei a facilidade com que algumas pessoas chamam de “minha grande amiga” uma infinidade de gente. Considero a amizade um espaço quase sagrado e por isso apertado. Para mim, cabem poucas pessoas.

Tenho muitos conhecidos e colegas, também uma conquista na vida. Amigo e amiga, no entanto, só consigo dizer para poucos. Por isso, fico incomodada de alguém usar essa posição privilegiada à toa. Como se contasse vantagem. Não parece?

Pode ser que não. Sei que estou sendo intransigente. Coisa de quem está meio fora do espírito da época. Para o Facebook, amigos se contam às centenas. Para esclarecer o assunto, proponho um jogo da verdade. E convido todas as Dominiques para participar. Para você, o que faz alguém ser uma amiga ou amigo?

Para quem é meio tímida ou pouco sociável, o máximo grau de amizade é poder ficar ao lado de alguém em silêncio sem se sentir aflita ou envergonhada. O silêncio é uma medida, assim como a vontade de falar sem travas, porque sabe que vai ser ouvida sem julgamento e com compaixão. Falo dos retraídos, porque me parece que os extrovertidos têm mais facilidade para fazer amigos e não têm dificuldade em puxar conversa.

Um segundo critério para a amizade consiste em saber com quem podemos contar nos momentos críticos. Comparecer em situações barra pesada mesmo – desemprego, falta de dinheiro, acidente, luto, crise de pânico, depressão. Muita gente não vai concordar, mas tenho minhas restrições a essa medida.

Nessa altura da vida, aprendi que esse gesto tem mais a ver com o espírito generoso do que com a amizade. Pessoas generosas ajudam os amigos e também novos conhecidos. Alguns nunca deixam de fazer uma visita no hospital e até servir de acompanhante. Outros, emprestam dinheiro a quem pedir. Alguns usam a habilidade de head hunter para conseguir trabalho para quem precisa. Continua valendo como medida?

Vamos a outro critério. Amizade vem de quem sempre ouvimos um sim para as coisas boas da vida. Festas, happy hours, viagens, shows, jantares, curso de dança, tarde no cabeleireiro, procurar um vestido. Maravilha. Sabemos o que dói não ser convidada ou não ter alguém para dividir um momento feliz. Mas como será a disposição dessa amizade para os momentos não felizes? Fico em dúvida.

Alguém pode defender – amigo é com quem a gente convive. Está certo, mas como explicar aquela situação de passar tempos sem ver alguém e retomar a conversa no mesmo ponto e com a mesma alegria? Por fim, ouvi uma definição que pode ser colocada nessa lista – amigo é aquele para quem podemos chegar desarmados. Não tenho restrição.

Então, o que faz a amizade ser verdadeira? Enquanto vocês pensam, lembrei de como as manifestações de amizade podem ser variadas e até estranhas. Vejam só:
Tem gente que tem amigos um a um.
Outros têm amigos em grupo.
Existem amigas que formam quase um casal.
Conheço quem se relaciona com muita gente e não tem um amigo íntimo.
Conheço outros com dificuldade de conversar com o vizinho e capazes de ser íntimos de cinco pessoas.

Alguns chegam na casa de alguém sem avisar e, se a porta estiver aberta, entram sem bater.
Existem aqueles que precisam marcar hora e local ou receber convite para encontrar o amigo.
Tem o marido amigo.
A irmã amiga.
O filho amigo.
Há os que substituem a família pelos amigos.
Tem quem não consegue fazer amigos fora da família.
Tem mulher e tem homem para quem a amizade só é possível com o mesmo sexo.
Tem quem ache que amizade não tem sexo.

Como se vê, amizade não se discute. Mas não é bom saber que a gente tem amigos? Digam lá Carole King e James Taylor.

Leia Mais:

A Maior Aventura de Minha Vida – O Chamamento, Capítulo 1
Vexame 3 – O Retorno – O creme de leite azedou o aniversário do filhote

Inês Godinho

Jornalista, brasileira, ciente das imperfeições e das maravilhas da vida. Contradições? Nada causa mais sofrimento do que um texto por começar e não há maior alegria que terminá-lo.

5 Comentários
  1. Amigo prá mim é aquele com quem vc conta para rir , chora… Aquele por quem vc ou ele está sempre por perto quando um ou o outro precisa.

  2. Para cada um existe um critério.
    De qualquer modo o texto é bastante reflexivo, em tempos onde amizades são tão banalizadas.

  3. Amigos individuais ou em grupo..tem pra todo gosto..aprendi q o bom é a afinidade do coração e da alma, que não coloca restrições..como vc bem pontuou…
    Belo texto. Obg.

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Não sou nada fácil, mas alguém aí quer ser minha amiga?

Dominique - Amiga
Adoro conversar, trocar ideias, debater, fazer amizades, conhecer outras culturas, provar novos pratos, tentar coisas novas, jogar conversa fora com estranhos, etc e tal… Custou para eu perceber que não sou bem quista. Eu tenho algumas teorias para compreender o motivo. Tá, ok, sou meio chata, falo pelos cotovelos, pavio curto, falo o que penso. Tá, eu sei. Mas, por outro lado, sou gente fina, elegante e sincera, entretanto quero tratar de minhas teorias da conspiração.

Acho muitíssimo raso rotular uma pessoa, mas se preciso me colocar em algum lugar dentro da loucura humana, sou uma pessoa de centro. Não suporto extremismos, embora eu saiba que um polo necessita do outro para haver um equilíbrio.

Não pertenço à nenhuma ideologia, me sinto livre para pensar como quero e a estabelecer relações com o inimigo, ou seja, aqueles de direita ou esquerda em tudo: política, religião, educação, economia, justiça social, sociologia, filosofia, espiritualidade e ativismos variados…Tudo para mim é relativo.

Percebi que ocupo a pior posição possível dentro de uma sociedade, ainda que eu queira me dar bem com tudo e com todos, aceitar todas as diferentes posturas e esteja aberta a manter minha mente sempre em busca de informações, reflexões e aprendizado e, ainda, compreender e aceitar que uma pessoa não é só uma determinada opinião. Ela costuma ser mais do que isto. Ainda assim não sou bem-vinda em nenhuma turminha.

Veja minha triste situação: se eu estiver em uma rodinha de direita extremista e disser que sou a favor de algo que eles são contra, esta opinião me define como esquerda caviar, comunista, ignorante política, assassina, sem Deus no coração e massa de manobra da TV Globo.

Se estiver em uma rodinha de esquerda extremista e digo algo que eles são contra, eu sou uma coxinha fascista, ignorante política, golpista, massa de manobra da TV Globo.

Eu sou daquelas que aceita todo mundo e que quer ser do clubinho de todo mundo. Este tipo de gente, como eu, é vista como duvidosa, “vacilona”, em cima do muro, espiã do grupo do outro lado, hipócrita, duas caras, inerte, cabeça de vento, massa de manobra da TV Globo.

Quer outro exemplo de como eu tumultuo um ambiente? Se eu for a um churrasco de amigos e digo que sou vegetariana…Você consegue imaginar? Olhares e rodinhas se formam e expressões entre desconfiança de que eu pertença à alguma seita ou olhares de pena.

Pior que isto: como meu marido e nem a minha filha são vegetarianos, às vezes, tentando não tumultuar nem gerar muita polêmica, eu aceito um pedaço de linguiça… Sabe aqueles que sabem que eu sou vegetariana e aqueles amigos veganos? Então…

Só queria desabafar mesmo! Hoje acordei bem “chateada”! Não me julguem, não vou aguentar!

Vocês se identificaram com a Cynthia? Alguém se candidata a vaga de amiga?

Leia Mais:

Sobre vínculos, o que entendemos que seja o amor ao longo do tempo
Amiga pra valer é tão gostoso quanto café com leite

Cynthia Camargo

Formada em Comunicação Social pela ESPM (tendo passeado também pela FAAP, UnB e ECA), abriu as asas quando foi morar em Brasilia, Los Angeles e depois Paris. Foi PR do Moulin Rouge e da Printemps na capital francesa. Autora do livro Paris Legal, ed. Best Seller e do e-book Paris Vivências, leva grupos a Paris há 20 anos ao lado do mestre historiador João Braga. Cynthia também promove encontros culturais em São Paulo.

6 Comentários
  1. Moro em Osasco 38 anos, e sinto muita falta de ter uma amiga pra conversar passear.

  2. Sou assim também, odeio essa “ditadura da opinião” dos dias atuais, na qual vc é OBRIGADO a tomar partido de um lado (política, religião, etc).
    Tenho minhas crenças pessoais, mas respeito todas as religiões.
    E quanto à política, jamais defenderei nenhuma ideologia.
    Sei bem como vc se sente…

  3. Cynthia, aceita ser amiga de uma mulher de 76 anos? Sou viúva há 4 anos depois de casamento feliz de 48 anos. Adoro a vida, gosto de viajar, dançar, conversar sôbre tudo, mas falta me companhia e incentivo, tenho pouquíssimas amigas e todas ainda casadas, o que dificulta nossa convivência. Gostaria de sair do “casulo”, o que vc acha? Um beijo a você tb uma dominique!

  4. Que maravilha saber que não é a idade que chegou e que não sou preguiçosa! Mas está tão difícil conviver com as pessoas! Não conseguimos mais dialogar sem o outro se sentir ofendido ou discriminado… aí a decisão é ficar meio no meu canto.. Cy, você quer ser minha amiga?

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Mentira do bem – 3 mentiras que contei para não fazer mal a ninguém

Vamos falar sobre mentira?

Mentira #1

Oba…Festa de 50 anos da Alice. Festão. Vai todo mundo. Sabe quando as amigas estão no maior frisson? Whatsapp a mil.
– Com que roupa você vai?
– E cabelo?
– Você me empresta a sua clutch vermelha?
– Você sabe se fulano vai?
Enfim, esta curtição de antes do evento é uma delícia. E chega o dia. Valentina combinou de passar para me pegar.
Entro no carro e noto que a maquiagem dela está um pouco pesada. Mas deve ser a pouca luz.
– Nossa, Dominique, como você está bonita.
– Você também, Vale.
Chegamos à festa e, ao sair do carro, percebo que a Valentina, além de estar com uma maquiagem muito pesada, usava uma roupa que a engordava e a envelhecia.
Errou. Errou feio. Fazer o que? Acontece.
– Gostou da minha roupa, Dominique? Estou bem?
– Sim, amiga. Está ótima!
Menti. Menti. Menti.
O que adiantaria, já entrando na festa, dizer que aquela roupa não a estava favorecendo? O que adiantaria deixá-la insegura? Por que cargas d’água estragaria a noite dela?
Entramos, conversamos, dançamos, bebemos, rimos e fomos embora.
Com certeza ela deve ter sido alvo de fofoquinhas maldosas de algumas coleguinhas. Mas até aí, falamos de um monte de outras também. Faz parte.
E, numa outra ocasião, com calma e com muito jeito, falei que talvez aquela saia não ficasse tão boa com aquela blusa.

Mentira #2

Num boteco qualquer, lá pelas tantas, depois de outras tantas caipirinhas, Suzana me jurou amizade e amor eterno. Sabe aquelas coisas?
Eu disse que, da minha parte, ela sempre teria o mesmo.
– Dominique, sou e sempre serei a sua amiga, até de baixo d’água. Você sempre poderá confiar em mim. Desta boca só a verdade. Deste coração só amor sincero.

Muiiiiiita caipirinha. Eu sei. Mas, mesmo com todo este teor alcoólico nas veias, o teor de seu discurso parece coerente, né? Me desculpe. Não. Nem sempre. Não para mim.

Algum tempo depois esta mesma amiga foi vítima de uma reviravolta na sua vida.
Passou por baques e perdas horrorosas. Sofrimentos profundos.

Procurei Tânia, outra amiga nossa em comum, amiga muito querida, que com certeza poderia apoiá-la num determinado aspecto. Liguei, conversei e aguardei um retorno. Aguardei. Liguei novamente. Mandei mensagem. Aguardei. Até que, finalmente, a Tânia respondeu. Por mensagem…“Por favor, Dominique, não tenho estrutura e não quero me envolver com os problemas da Suzana. Não me procure mais. Sigamos nossos caminhos, quem sabe um dia, lá na frente…”

Li a mensagem, respirei fundo, deletei não só a mensagem, mas o contato dela e fui ver minha amiga Suzana.
– Suzana, você acredita que a Tânia está morando na Namíbia? Sério. Foi o primo dela que me contou. Por isso que não conseguia falar com ela.
– Nossa, será que ela está bem lá? Namíbia? Tão longe… Tomara que esteja bem, né, Dominique?
– Tomara.

Mentira #3

– Dominique, você é minha amiga, minha super e melhor amiga. Se um dia você souber que o meu marido está me traindo quero que você me conte.
– Vera, pois eu não. Não quero que você me conte caso saiba que estou sendo traída.
– Mas por quê? É claro que eu vou te contar.
– Querida. Se eu estiver sendo traída, em algum nível de minha consciência eu vou saber. Se não fui atrás, é porque não quis. Se não fui fuçar no celular dele, é porque não quis saber. Mas, se você me contar, AÍ eu vou ficar sabendo e AÍ TEREI que tomar uma atitude. Você entende?
– Ah! Mas comigo é diferente. Se você não me contar, eu vou considerar VOCÊ a traidora.

Suspirei fundo. Olhei para baixo. Fiz uma pausa para reflexão. Aproximei a minha cadeira da dela. Segurei em suas mãos. Olhei em seus olhos e disse:
– Bom, Verinha, se é assim, preciso te contar uma coisa muito séria.

Verinha ficou branca. Sua mão imediatamente molhou daquele suor gelado. Seu lábio começou a tremer. Mas o pior, pior de tudo, foi o jeito que ela me olhou. Seu olhar era de ódio. De raiva. E, ora vejam, contra mim. Ela estava com raiva de mim.
– Conta, Dominique. CONTA! Conta agora!
Soltei sua mão. Afastei a cadeira.
– Não, Vera. Não sei de nada. Não sei mesmo! Mas veja a sua reação.
Quero apenas que pense no que sentiu agora. E se quer realmente saber o que talvez não queira. A única coisa que eu posso te garantir é que EU não sei de nada.

Mentir é feio? Depende. Às vezes, a mentira é para o bem!

Leia mais:

Arrumar armário pode ser o começo de um novo ciclo
Passeando com o passado

Eliane Cury Nahas

Economista, trabalha com tecnologia digital desde 2001. Descobriu o gosto pela escrita quando se viu Dominique. Na verdade Dominique obrigou Eliane a escrever. Hoje ela não sabe se a economista conseguirá ter minutos de sossego sem a contadora de histórias a atormentá-la.

5 Comentários
  1. Adorei, Dominique, suas Três Mentiras…
    Realmente,tem hora que precisamos analisar profundamente se realmente vale a pena contará verdade para alguém!
    Já vivi isto e optei pelo silêncio… A verdade, naquele momento não seria boa para ninguém!

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O dia em que o palito de dente ficou preso na saída – AIQDÓ

Dominique - Palito
Você já comeu palito de dente? Eu tenho um amigo que já…

Reconheço que tenho um péssimo hábito há milênios. No dia-a-dia não sei comer pausadamente e nem saborear a refeição. Me atraco com a comida como se estivesse num ringue de MMA. Ou eu ou ela. Vivo correndo alucinadamente, sempre tirando o pai da forca. Paciência não é meu forte. Deve ser o último item da escala.

Quando a fome aperta a situação se agrava e muito. Meu humor é irascível. Tenho paúra de pegar fila. Evito a qualquer custo lugares com filas para esperar horas a fio.

Preciso querer muito, mas muito mesmo alguma coisa para me sujeitar a entrar numa fila indiana. Se for para comer, nem pensar. Não fico nem amarrada. Ao me deparar na entrada de um restaurante com um amontoado de gente que se procria à medida que o tempo vai passando não fico nem para salvar a vida de alguém. Há tanta opção para comer em São Paulo, me recuso a fazer um programa de índio, mesmo tendo tacape, cocar, arco e flecha no porta-malas do carro. Aliás, uso com mais frequência do que gostaria.

Para chocar os paladares mais refinados, confesso que considero a comida por quilo a invenção do século. Para meu esquema frenético de ser, cai como uma luva. Entro, me sirvo somente daquilo que eu quero, engulo a comida, pago e vou embora para Pasárgada.

Nem fast food eu aguento mais. Pegar senha para ser chamada, já basta quando vou fazer exames nos laboratórios, em jejum, tentando subornar alguém por um biscoitinho e um café.

Mas não estou só. Outros também se alimentam no estilo de um peru em véspera de Natal. Comer rapidamente virou uma epidemia. Basta ver as praças de alimentação dos shoppings. Ninguém esquenta a cadeira. Se inventasse um comprimido para o arroz, outro para feijão, um para carne e outro para legumes, o comércio de alimentos estaria muito mais rico do que já está.

Tenho um amigo, também jornalista, que no quesito velocidade em comer, dispara muito na frente, bem longe de mim. Jamais poderia participar de um rally gastronômico de regularidade.

Além de ser um Lewis Hamilton na degustação, o danado é guloso. Nem vê o que está comendo. “É para comer? Manda um ai”.

Num coquetel, esta criatura se empanturrou de salgadinhos. Fritos, assados, crus. O que pintasse na rede era peixe.

Amanheceu com uma dor aguda no abdômen. Foi levado às pressas para o pronto-socorro. Apendicite, pedra no rim, diverticulite? Ninguém sabia. O cara estava muito mal. Uivava como um lobo em noite de lua cheia.

Chegamos ao hospital para dar uma força e encontramos sua esposa às gargalhadas. Eu nem imaginava que o casamento ia mal. Fiquei assustada com o comportamento maquiavélico da adorável cônjuge.

Ela tentava desesperadamente pegar um fôlego, mas não conseguia. Tudo bem tem gente que sofre de riso nervoso diante de grandes traumas, mas aquilo já era demais.

Depois de alguns minutos tentando controlar sua risada frenética, eu já querendo bater em sua cara tamanho o desaforo com o marido doente, ela diz:
– Sabe o que ele tem? Palito.
Eu digo:

– Como assim? Que doença é essa Palito?

Ela não aguenta, ri de novo e explica:

– Ele comeu uma coxinha e nem sentiu o palito. O dito cujo ficou atravessado na horizontal na saída, entende?

O infeliz com o palito lá no fiofó foi para a cirurgia, tomou anestesia geral e o que é muito mais desastroso, teve que aguentar todas as provocações e a tiração de sarro.

Nem o médico conseguia falar com ele sem chorar de rir. E, cá pra nós, não tinha como  acusar o doutor de antiético. Ninguém se controlava.

Os mentecaptos no escritório tiveram a sacada de comprar caixas e caixas de palitos Gina para decorar sua sala.

Passaram-se 20 anos e ninguém esquece do ocorrido para desgraça deste ser. Um episódio surreal.

Nem assim aprendi a comer que nem gente normal.

Dica do dia: cuidado para não comer palito de dente!

Leia mais:

Comodidade, hábito ou perda de memória? Experimente ficar sem celular!
Feriado só com mulheres? Nossa Senhora Aparecida que me salve!

Marot Gandolfi

JORNALISTA, EMPRESÁRIA, AMANTE DE GENTE DIVERTIDA E DE CACHORROS COM LEVE QUEDA PARA OS VIRALATAS.

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