Sabe dessas coincidências? Quando a vida traz gente de seu passado, de sua adolescência para seu momento atual? Pessoas que você lembra do nome, sobrenome, da carinha, da voz, mas que não vê há 30, 40 anos mais ou menos.
Pois é, a pandemia fez com que eu soubesse, que no prédio em que resido há mais de 15 anos, alguns andares abaixo, mora uma amiga de antigos verões. Veja você em que mundo vivemos.
Ela mudou para o prédio faz um tempo, entretanto nunca nos cruzamos e, aliás, continuamos sem nos cruzar. Soubemos uma da outra pelo grupo de WhatsApp formado pelo síndico, para que pudéssemos tomar decisões rápidas nesses tempos estranhos.
Bem, logo que vi seu nome, liguei, identifiquei-me e lembramos nossas histórias, falamos, rimos, tudo por telefone. Prometemos que nos encontraríamos assim que o prefeito deixasse. Acabei por sair de São Paulo em junho para cumprir a quarentena em outros ares e foi aí mesmo que não nos vimos mais.
Qual não é minha surpresa, quando essa semana recebo uma delicada mensagem dessa vizinha.
Oi Eliane tudo bem? No fim nem nos encontramos mais aqui no prédio. Não aguento mais essa pandemia, máscaras e etc. Tenho saído e feito o que dá, acho que adquiri imunidade própria! Kkk
Mas estou pra te falar que uma amiga do prédio vizinho está ouvindo seu cachorro chorar toda noite e está com pena, pois não sabe se ele está doente ou com medo de ficar sozinho… Enfim, como ela falou tanto… Estou só te repassando. Talvez vc nem ouça pois fica no andar de baixo, sei lá. Bjsss e desculpe me intrometer.
Muito fofa. Não entrou direto no assunto até porque imagino como foi difícil para ela mandar essa mensagem, afinal, o assunto é delicadíssimo uma vez que estamos falando de maus-tratos de animais. Afff. Tadinha.
Agora, é óbvio que ela não me conhece tão bem, pois não há nesse universo, pessoa próxima que não saiba de meu “medo” de bichos. Não sei se é bem medo, talvez seja falta de afinidade, peninha, é difícil de definir.
O negócio é que isso é algo notório e muito característico de minha pessoa. No final das contas, todo mundo tem alguma peculiaridade ou característica própria, por exemplo: quando você vai receber fulana X, você sabe que não pode fazer nada com camarão, pois ela alérgica até ao cheiro. Quando você sai com a amiga Y, você não pede suflê, pois ela não suporta cheiro de ovo. Quando combina uma viagem com o cicrano W, não propõe nada que vá muito além da Ponte Pênsil (a de São Vicente), pois sabe que ele odeia ficar longe de casa muito tempo. E da mesma forma, todo mundo sabe que quando a Eliane vai visitar, é melhor prender o Thor. Simples assim.
Então, isso posto, é claro que dei um desconto para minha amiga, pois era claro seu desconhecimento de meus hábitos e da minha casa. Respondi educadinha também.
Querida, boa noite, tudo bem? Estou fora de São Paulo há 1 mês. Muito obrigada por avisar, mas eu nunca tive cachorro.
Aliás, animal algum.
Relendo minha própria mensagem agora, surge-me uma dúvida. Por que será que eu agradeci ela ter me avisado de algo que não existia? Bem, sei lá. Penso que foi no calor da coisa, e na ânsia de responder rapidamente, eximindo-me de qualquer responsabilidade pelo animal mal tratado, e ainda querendo, talvez, quem sabe, insinuar que a amiga de minha amiga era um tantinho desinformada.
Bem, foi eu mandar a mensagem, para me dar um estalo.
Liguei para meu marido.
– Tudo bem?
– Oi!! Tudo ótimo.
– Me diz uma coisa, tem algum cachorro em casa?
Silêncio. Um frio na espinha me percorreu.
– Responde!
-Em casa, em casa, não.
-Você tem 5 segundos para explicar.
-Eu não tenho nada a ver com essa história. O cachorro é dos seus filhos e está do lado de fora de casa. Fale com eles.
Oi? Como assim? Então, não só tinha um cão em casa, a revelia, mas estava sendo mal tratado? Como???
Encaminhei a mensagem que eu recebi no grupo da família e escrevi na sequência:
ElianeC: Eu não admito receber uma mesnagem dessas!! é para isso que vcs querem ter cachorro?
VCS SÓ PODEM ESTAR BRINCANDO!!
Silêncio.
Diante da falta de resposta, virei a artilharia para o Whatsapp do Traidor Mor. Meu marido, é claro. Falei um monte! O que ele respondeu? N-A-D-A!
Ninguém me ligou. Niguém escreveu uma única palavra.
O que você faria no meu lugar? Além de pedir desculpas para a vizinha que eu peço aqui publicamente. Adriana querida, so sorry!!
Meu nome é Dominique! Amei!