Mais uma vantagem que pertence à era Dominique: ter vivido e viajado em um mundo analógico, sem internet e estar aqui para contar a história!
Era o ano de 1988.
Eu trabalhava na agência de publicidade W/Brasil e havíamos perdido o prazo da Rede Globo para entregar as peças publicitárias e o espaço já havia sido comprado. Todas as peças de veiculação nacional tinham que ser enviadas e entregues em mãos a cada filial da emissora por todo o país.
Bem, talvez, se fosse hoje, o caos estaria instalado. Talvez a reação de um profissional sem internet, sem sedex e com prazo estourado fosse similar a uma ameaça de guerra.
Mas, naquela época, o que houve em um final da tarde, geralmente regado a picolé de uva, foi um bafafá (termo usado, naqueles tempos, indicando um murmurinho).
E se a solução dos problemas hoje em dia é mais eficaz, eficiente e num piscar de olhos, naquela época, no entanto, era, muitas vezes, poético.
A saída para a crise foi enviar fiéis mensageiros, como pombos correios humanos, em asas metálicas em um bate e volta, a cada capital para entregar, o que na época era uma espécie de tijolo, o filme publicitário.
Fui sorteada para entregar a peça no Recife. Minha missão era a de colocar o filme nas mãos de um responsável da emissora que estaria esperando no aeroporto.
Sempre prevenida viajei com um biquíni básico por baixo da roupa. Nunca se sabe, não é? (Nunca fui ao Rio de Janeiro sem um biquíni por baixo de meu uniforme de executiva! Não perco nem a classe e nem o desfrute).
Ao chegar, o responsável me ofereceu uma carona para onde eu quisesse ir. O voo de volta a São Paulo era dali a seis horas. Claro, parei em Boa Viagem, fui dar um mergulho e almoçar. Naquela época os tubarões não mordiam ninguém. Negociei um quarto de hotel por 2 horas, deixei minha bolsa e saí “a la caiçara desde sempre”!
Após meu demorado mergulho e um cochilo sob o sol, retornei ao hotel para tomar banho e peguei um táxi a fim de voltar ao aeroporto.
Conversando com o motorista contei do motivo de estar ali e ele perguntou, então, se eu conhecia Olinda. Ao responder com ar negativo e frustrante o sujeito deu meia volta, fez o caminho contrário ao aeroporto, em direção à cidade patrimônio da UNESCO.
Verdadeiro guia me contou um pouco de tudo. Batia uma brisa agradável e pude caminhar no novo destino totalmente improvisado (anos mais tarde voltei à cidade com reservas de hotel, motorista, hora marcada. Não foi, nem de perto, tão emocionante quanto ao dia do improviso).
Na volta do passeio, em excelente companhia do guia/taxista, ainda parou no mercado – que ainda não tinha pegado fogo – e me trouxe um acarajé gigante e água de coco, para que meu trajeto até o aeroporto fosse regado com as melhores sensações.
O passeio, serviço de guia e quitutes a bordo não custaram nada, além do trajeto hotel-aeroporto! Com prazer dei uma bela gorjeta. Isto sim é um profissional de marketing dos bons.
Meu voo fez uma escala em Brasília. No embalo do improviso, enquanto um povo descia e o outro subia, ousei bater na cabine do piloto. Perguntei se eu poderia ver de frente um avião decolar. Supersimpático ele autorizou de imediato.
Hoje, acredito, não seja mais permitido, mesmo porque ninguém ia querer, já que é possível ligar o celular e enviar e-mails, checar o Instagram, Facebook, Twitter e Linked in durante o voo…
Assim, apertei meu cinto em uma banquetinha bem atrás do piloto e fiquei bestificada com o número de botões a checar antes de partir. Foi lindo! Ele pediu, então, que eu retornasse ao meu assento e disse que eu poderia voltar, mais tarde, para assistir o pouso.
Já praticamente da família e me sentindo parte integrante da tripulação, voltei à cabine de comando com ares de copiloto. Acho que cedo demais, porque a cena que vi nunca mais saiu da minha memória. O piloto estava comendo uma fatia de melancia com as duas mãos! Ninguém segurava o manche!!!
Ao ver os meus olhos de terror me tranquilizou contando das modernidades de um piloto automático. Enfim, já havia anoitecido e pude assistir São Paulo (uma verdadeira caixinha de joias brilhando no horizonte) de frente ao pousar em Congonhas!
Ainda bem que não havia Internet naquela época. E ainda bem que hoje tem, assim posso contar esta história para você! Coisas da vida de quem vive há mais de 50 anos.
É Dominique, a gente costumava resolver as coisas com criatividade, poesia e desfrute, não concorda comigo?
Internet é bom, mas viver o que vivemos sem ela, é indescritível!
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Muito legal Marot
Eram bons tempos e a gente se via mais….
Amei esse post!muito legal