Previsões…Quem acredita nelas?

Ahh, foi uma noite de réveillon  muito gostosa com amigos que resolveram juntar as ceias para que pudessem estar juntos nos últimos minutos de 2019 e principalmente começar 2020 dentro de abraços verdadeiros.

Adoro essas coisas que acontecem meio de última hora e de improviso. Não faz mal o cardápio ter 2 lasanhas, 2 pratos de bacalhau, 4 salpicões. Ninguém pediu para que fossemos criativas na hora de bolar a ceia. O importante é que não faltasse a lentilha, a romã e as 7 ondinhas para pularmos.

Todo mundo de branco, pedindo paz. Bem verdade que eu estava de azul, mas essa também é uma cor para quem está em busca de tranquilidade.

Foi-se o tempo que ficávamos acordados para ver o sol nascer. Atualmente nossas festas de ano novo acabam pouco tempo depois da queima de fogos que aliás são silenciosos hoje em dia. Não acho nem bom nem ruim estar na cama antes das 2h da manhã porque a única certeza que sempre tenho é que as 6h30 estarei de pé. Vai entender meu ciclo de sono, né?

Como sempre, fui a primeira a acordar em casa. Na verdade acho que fui a primeira a acordar no condomínio. Ou talvez na praia inteira.

Coloquei meu biquini e desci correndo pra praia naquele lindo amanhecer.

E aí sim, tive a certeza que fui a primeira pessoa a acordar no mundo!!

O sol estava ameno tentando aquecer a areia antes que eu nela pisasse, o mar tranquilo como que descansando da agitada noite de festas e sem ondas para não fazer barulho, tomando cuidado para não atrapalhar meus pensamentos. Percebi que o verde das montanhas que faz das praias de nosso litoral tão únicas, estava mais verde que de costume num enorme contraste totalmente integrado àquele céu azul cristalino.

Não tinha como me sentir mais feliz, mais próxima do Sublime. A cada respiro um admirado suspiro de encantamento.

Resolvi que precisava me integrar ainda mais com aquilo tudo e entrei no mar deixando que ele me envolvesse.

Estava tão divino e harmonioso que por um momento cheguei a acreditar que eu fazia parte daquilo. Que eu era aquilo tudo.

Talvez por isso me assustei quando vi uma mulher na areia, olhando em minha direção. Ela conseguia me ver, distinguir-me naquele cenário idílico. Eu não era mais uma peça integrada a paisagem deslumbrante. Eu era um elemento a mais. Assim como aquela mulher. Ela também estava sobrando e destoando de toda aquela elegância e equilíbrio de texturas e cores.

Era tanta a insistência de seu olhar que acabei por sair daquele abraço molhado.

Sentei na areia para me secar ao sol, sem me importar no “croquete”em que isso me tornaria, enquanto olhava a mulher contra a luz. Ela de pé com aquele vestido branco, lembrou-me Clara Nunes saindo de uma roda de samba. Ahh, tenho caminhos mentais que nem eu mesma entendo.

Sem cerimônia ela caminhou em minha direção e sentou ao meu lado.

– Feliz Ano Novo – desejei a ela que apenas sorriu.

Sorriu um sorriso triste porém resignado.

E como se fossemos velhas amigas perguntei.

-Por que essa tristeza?

-Porque também gostaria de lhe desejar um feliz ano, mas não sei mentir.

-Oi???

Tenho tentado evitar esse meu “oi?” que considero uma das mais burras expressões já inventadas pelo brasileiro. Mas ele ainda vem em situações de espanto genuino.

Continuando.

-Oi??? O que você quer dizer com isso? Aliás, quem é vc? Onde é sua casa?

-Meu nome é Soraia. Não sou daqui. Também não ficarei. Vou-me embora enquanto posso.

-Como assim Soraia? Não estou entendendo nada.

-Tenho que ir embora agora, enquanto posso, porque em breve teremos nossa liberdade tomada numa batalha inglória – disse -me Soraia com o mesmo sorriso triste.

Olhei para ela tentando imaginar o tanto que ela devia ter bebido naquela madrugada ou se estava sob o efeito de alguma droga.

Para ter o que contar ou simplesmente pelo prazer de ser o irritante contraponto retruquei:

– Se está com medo do trânsito já deveria ter ido embora. Daqui pre frente serão 7 horas presa dentro de um carro.

Foi aí que ela me contou que esse ano a humanidade enfrentaria o caos. Que fronteiras seriam fechadas e os vôos cancelados. Empresas e comércio fechariam. Falou que os governos decretariam que as pessoas não poderiam mais se encontrar, e que deveriam ficar trancadas em casa. Cada um em sua “caverna” por mais de 30 dias.

Olhei para Soraia esperando uma gargalhada depois de seu ponto final.

A gargalhada não veio, nem mesmo um sorriso.

Nesse momento parece que acordaram o vento que resolveu se manifestar mexendo com os cabelos ondulados daquela mulher, como que num cafuné para acalantar seu choro e suas lágrimas.

Aí, você leitor pergunta qual foi minha reação diante daquela cena.

Sou obrigada a confessar naquele momento aquilo tudo foi apenas mais uma história da praia dentre tantas que já coleciono.

Perguntei a Soraia se queria tomar um pouco de água ou comer alguma coisa pois tinha certeza cá com meus botões que aquela mulher estava tendo uma tremenda de uma bad trip.

Voltei para casa pensando se tinha ouvido bem aquelas últimas palavras de despedida.

-Lenha no Coronel!! Lenha no Coronel!

Eram palavras que o vento dissipava, mas que chegaram a meus ouvidos com uma certa clareza.

Entendi tudo naquele momento. Soraia era contra o então presidente que não era exatamente um Coronel, e sim o Capitão.

Affff…Mais uma engajada pra me encher o saco. E essa ainda veio com discurso que insinuava uma guerra nuclear , terceira guerra mundial, sei lá… Que falta de respeito com os neurônios alheios. No primeiro dia do ano! Só eu mesma pra trombar com uma louca dessas.

Voltei para casa e para os amigos sem coragem de comentar tal insólito encontro.

Vida que segue.

Hoje, 100 dias após conhecer Soraia, entendi o que aquela frase queria dizer.

Não era exatamente Lenha no coronel.

Mas sim:

– Compra álcool gel! Compra álcool gel!

bem querido leitor, não era assim que ia terminar essa história. Ia falar do egoísmo mundial, da mesquinharia humana, mas pra quê??? Deixa assim, né?

Vamos torcer para Soraia reaparecer trazendo alguma novidade menos cruel que seja adoçada com muito mel de maneira que tudo isso não passe de literatura de Cordel. Abaixo o álcool em gel!

Leia também:

Segredos da minha praia

Eliane Cury Nahas

Economista, trabalha com tecnologia digital desde 2001. Descobriu o gosto pela escrita quando se viu Dominique. Na verdade Dominique obrigou Eliane a escrever. Hoje ela não sabe se a economista conseguirá ter minutos de sossego sem a contadora de histórias a atormentá-la.

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