O pessoal brinca que sou eu que abro a praia, acendo o sol, ligo as ondas, penteio a areia e ensaio os cardumes de peixinhos para darem showzinhos para a criançada. Isso porque sou sempre a primeira a chegar a praia.
Acordo cedo. Muito cedo.
Quando o primeiro raio de sol insinua-se pela fresta de minha veneziana, pulo da cama, coloco biquini, tomo meu café como se fosse uma bebida sagrada e vou andar na praia.
Você não tem ideia do prazer que é andar num dia de verão, 7 horas da matina, ouvindo música, sempre com ela – passei pelo walkman, discman, Ipad, Iphone – numa praia completamente deserta.
Uma felicidade que nunca consegui descrever.
Jamais capturei a beleza destes momentos em foto alguma.
E não há vez que eu não fique emocionada. É nesse momento que eu sinto a presença de Deus. São nessas caminhadas que eu tenho certeza de Sua existência e de Sua companhia.
Como vou muito cedo, sempre tenho a praia só pra mim. E como se tivéssemos feito um pacto de sermos uma da outra naquelas horinhas.
Ahhhh, mas vez por outra, alguém aparece.
E me sinto traída.
Enciumada.
Com um sentimento de ter sido invadida.
E obviamente um tanto ridícula também.
Isso começou acontecer com mais frequência num determinado ano, lá atrás. E na grande maioria das vezes, era sempre a mesma pessoa.
Uma mulher. Mais ou menos da minha idade. Morena. Mais ou menos como eu.
Isso aconteceu por muito tempo. Não sei precisar. De tanto nos cruzarmos e de tantos bom dias, começamos a andar juntas.
Acho que nem sabíamos nossos nomes, pois os encontros eram muito casuais e as conversas de uma espontaneidade e verdade que talvez fosse melhor continuarmos estranhas íntimas.
Falávamos de sentimentos, de comportamento, de filhos, de casamento, de amizades com uma liberdade que talvez só nos permitimos justamente por não sabermos nossos nomes.
Até que um dia, descobrimos que nossos filhos, eram superamigos na praia. Estavam sempre juntos! Na verdade, foram eles que nos contaram.
– Mãe, você sabia que você anda todo dia com a mãe deles na praia?
Gente, existe amizade mais gostosa do que uma que foi estabelecida assim?
Descobri depois que ela se chamava Maria.
E conhecia minha queridissima vizinha Maria Eduarda – Duda, que frequentava aquela praia desde 197X, quando não se tinha porque usar salto, nem como ter um ventilador.
Foi Duda quem me falou logo que nossas casas ficaram prontas num condomínio com 10 casas, sendo a maioria dos moradores casais da nossa idade com filhos idem:
– Estamos na euforia do começo. De nos conhecermos. Muita coisa vai acontecer com o tempo. Daqui 10 anos muitos já não estarão aqui e muitos já nem juntos estarão.
Aquelas palavras me pareceram um tanto fora de contexto num momento em tudo era lindo e todos eram tão felizes.
Mas foram palavras proféticas. Muita coisa mudou ao longo destes anos todos. Mas muita coisa não.
Sabe a impressão que eu tenho depois de tanto tempo e tantas caminhadas?
Desculpe a pretensão, mas para estar naquela praia há de se merecer.
Há de se amar tanto a ponto dela não ter coragem de te fazer sair.
É ela quem manda. Sempre mandou.
Sim meninas. Somos grandes merecedoras da nossa praia. Beijocas
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