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Euforia: Trama delicada sobre o silêncio e a negação de um amor fraterno

Selecionado para a Mostra Un CertainRegard no festival de Cannes de 2018 e destaque da programação do Festival do Cinema Italiano no Brasil, “Euforia” é o tipo de filme que se aprofunda em seus personagens a partir das relações familiares vistas em cena.

“Euforia” é o segundo longa dirigido pela italiana Valeria Golino, uma das atrizes mais talentosas do cinema contemporâneo.

Valeria ampara bem suas ambições ao construir uma trama delicada que funciona muito bem.

Matteo (Ricardo Scarmacio) vive um personagem com bastante sensibilidade, é o filho perfeito, porém distante. Publicitário de sucesso, mora numa bela casa em Roma, tem muitos amigos e todos os luxos e conforto possível. Ettore (ValerioMastandrea), por outro lado, foi o que ficou na casa da família, no interior, e sempre levou uma vida mais acomodada. Professor casou cedo com a primeira namorada, e com ela teve um filho. Num primeiro momento é o mundo desse que começa a naufragar, quando recebe uma terrível notícia. Separado, morando com a mãe e com pouco tempo para cuidar da criança. Os dois, no entanto, são irmãos. E quando o caçula recebe a notícia sobre o que está acontecendo com o irmão mais velho, decide fazer tudo o que está ao seu alcance para ajudá-lo. Mesmo que aquilo que lhe é possível de imediato não faça muita diferença na vida do outro.

Desta forma, o grande potencial oferecido por seus personagens são as possibilidades de conflitos entre os irmãos devido às suas características pessoais. Ambos são figuras complexas, principalmente  Matteo, contribuindo para a dúvida sobre como cada acontecimento irá ser interpretado por eles. A cada nova interação entre os irmãos, suas histórias são reveladas aos poucos para o público, preparando-o para um choque capaz de acontecer a qualquer momento, mas muito bem construído até o final do longa.

“Euforia” é acima de tudo, um conto sobre os tempos que vivemos. E se mesmo assim tais rótulos acabam sendo explorados – aquele com todos os bens materiais sofre de solidão e carência, assim como o que enfrenta uma luta diária para seguir adiante tem mais com o que lidar dentro de si do que passa ao seu redor – eles surgem como ferramentas para um discurso superior, de fraternidade e aceitação. São humanos, repletos de falhas e alegrias, tristezas e acertos. E será esse conjunto que fará do banal, algo acima do esperado. Um acerto de pequenos detalhes, que resulta em um conjunto maior do que a soma das suas partes.

Próximo ao desfecho a produção brilha, com a solução encontrada para o conflito dos irmãos. 

Uma bela história sobre reconhecimento e aprendizado sobre a dor, utilizando como pano de fundo o relacionamento de irmãos com vidas distintas. Apesar de vidas conflitantes, ambos se querem bem acima de qualquer coisa.

Par o público mais aberto e disposto a prestar atenção, é suficiente para revelar incômodos e reflexões não tão fáceis assim, um feito notável do longa.

Muito bom!

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Assunto de Família – Real significado de uma família

Ganhador da Palma de Ouro de Cannes em 2018, Assunto de Família deixa claro: lida com tema muito caro para o diretor e roteirista japonês Hirokazu Koreeda. Aqui, ele tenta observar e estudar o que é exatamente uma família, como ela se forma e como ela se mantém unida, com uma esperada abordagem lírica para uma história simples.

Em Assunto de Família, somos introduzidos ao lar de uma empobrecida família japonesa da periferia de um centro urbano contemporâneo, Tóquio. Mãe, pai, tia, avó, duas crianças não compartilham laços de sangue, mas vivem juntos, dividindo refeições, a cama onde dormem e, sobretudo, frutos de pequenos furtos em mercados e lojas de roupa. Sobrevivem e, quando possível, se divertem, amam, gargalham, celebram.

Apesar de uma aparente conveniência – afinal, torna-se mais fácil sobreviver em grupo do que sozinho – as relações humanas entre os membros da família vão muito além disso. A comunicação se revela sempre íntima e direta, sobretudo quando eles precisam surrupiar roupas e frutas.

Desde a seqüência inicial até meados do filme somos chamados a testemunhar uma situação controversa que nos instala em uma desconfortável ambigüidade moral: a família vive de pequenos furtos, para os quais o menino Shota (Jyo kairi) é devidamente treinado, até fraudes e outros expedientes obscuros que vão progressivamente se acentuando. Por outro lado, os laços de fraternidade, companheirismo, apoio e afetos mútuos brilham na tela de modo cativante, apelando ao que há de mais profundamente humano em nossa capacidade de empatia e de compaixão.

Conflitos morais

Para nossa surpresa, o principal conflito diz respeito ao senso moral dos próprios personagens, quando um deles começa a questionar este modo de vida. Antes da transformação do drama ao suspense policial, a narrativa nos prepara com pequenos conflitos psicológicos. A ruína viria de dentro de cada um, e não do mundo exterior.

Koreeda sempre foi um diretor de histórias de famílias, com relatos apegados a sentimentos diversos, das dores às alegrias. Assunto que repete sua já conhecida discrição e naturalidade – ao tratar de cada personagem. É aí que o elenco brilha mais do que a direção singela do autor.

Assunto de Família desenvolve a motivação e desejo de seis personagens fascinantes, criando belos instantes de interação entre eles. É muito difícil atingir uma dinâmica tão fluida, simples e realista quanto esta.

Assunto de família mescla doçura e amargor na medida ideal – transitando facilmente entre a inocência do olhar infantil, com a sobriedade prejudicial de quando sabemos que nossos atos interferem diretamente com o bem estar do próximo.

Muito bom!

Aqui fica a dica!

Assista o trailer

Outros filmes na Netflix

Olmo e a Gaivota

Animais Noturnos


1 Comentário
  1. Adoro os seus post, vc consegue falar do filme sem spoiler mas colhendo o significado mai profundo. Obrigada Elza ! Acompanho os seus conselhos e nunca me arrependo. Parabéns! Continue

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A Favorita: sátira palaciana com humor ácido traz o antigo e o novo ao Oscar 2019

O premiadíssimo “A Favorita” conquistou sete máscaras douradas do Bafta, Academia Britânica de Cinema, além de dois prêmios no Festival de Veneza e teve presença de gala no Globo de Ouro e no Critics’ Choice Awards. 

O longa ainda concorre neste domingo, 24 de fevereiro, a dez estatuetas ao Oscar.

Considerado um dos grandes filmes do ano, “A Favorita” mescla com muita propriedade e talento tremendo humor àcido a uma trama sóbria da história e política. 

O filme traz um esplendor visual com figurinos e acessórios deslumbrantes. As locações mostram toda a grandiosidade da corte inglesa do século XVIII e a fotografia tem uma paleta de cores e um contraste que esperamos de um filme ambientado nessa época. Aí podemos elogiar as cenas de cozinha do palácio e especialmente as cenas com iluminação à luz de velas que são um verdadeiro presente para os olhos.

O cineasta grego Yorgos Lanthimos, o rei dos filmes perversos, faz aqui uma sátira sobre a realeza.

O longa conta a história da duquesa de Marlborough (Rachel Weisz) que exerce sua influência na corte como confidente, conselheira e amante da rainha Anne (Olivia Colman). Seu posto privilegiado, no entanto, é ameaçado pela chegada de Abigail (Emma Stone), nova criada que logo se torna a queridinha da majestade e agarra com unhas e dentes a oportunidade única.

O diretor usa todo o seu cinismo em “A Favorita” para mostrar um elaborado jogo de sedução e poder entre as três mulheres. O ponto alto do filme é mostrar esse conflito entre as duas pelo favoritismo da rainha e como ela reflete diretamente tanto na posição dessas mulheres na corte, como nos rumos da Inglaterra e da guerra.

Totalmente focado em personagens femininas e nos jogos de poder que se enclausuram nos bastidores, honra o período histórico a que se refere, mesmo diante de uma história absurda.

“A Favorita” retrata o luxo de modo crítico, e a vida de privilégios não é apresentada ao espectador de maneira desejável, e sim como uma configuração grotesca e artificial.

Com personagens indiscretos e famintos, o longa flagra o ser humano no seu pior e tem o despudor de rir disso e convidar sua audiência a se divertir com a própria tragédia.

O roteiro e os diálogos são um primor, bem como toda a parte técnica – devidamente ornada pelas indicações.

Com uma inspirada trinca de atrizes, todas merecidamente lembradas pela Academia de Artes Cinematográficas de Hollywood, “AFavorita” é um filme de época totalmente diferente de todos aqueles já vistos.

Além do domínio de Colman – no papel mais difícil, o resto do trio está tão a vontade que é difícil dizer quem é a protagonista e pilar dessa estrutura. Méritos para o roteiro e direção esmerada de Lanthimos.

O diretor transforma sua sátira sobre a realeza em uma profunda constatação do quanto as pessoas são imperfeitas, mas Lanthimos não se apieda de seus personagens, nem tampouco de seu público que precisa ou embarcar em sua sintonia, ou tolerá-la. Talvez seja melhor aderir a essa alucinógena narrativa.

E… the Oscar goes to…


Confira a resenha de outros concorrentes ao Oscar:

Bohemian Rhapsody

Green Book

A Esposa

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Green Book – Road Movie divertido, que emociona e faz pensar

Concorrendo ao Oscar de 2019, nas categorias: de Melhor Filme, Ator, Ator Coadjuvante, Roteiro Original, e Edição, o longa Green Book é sem dúvida um dos grandes favoritos.

Baseado em uma história real, Green Book tem no título uma referência a um livro que apontava hotéis e restaurantes no sul dos Estados Unidos que aceitavam afro-americanos.

Era uma divisão bem rígida: se um negro entrasse em um estabelecimento para brancos, ele seria no mínimo humilhado.

E foi usando o velho livro para guiá-los aos poucos estabelecimentos da região que eram seguros para os afro-americanos.

O sucesso de Green Book é deve-se às interpretações de Mortensen e Ali. A dinâmica da dupla ganha não só valor de entretenimento como profundidade.

Mortensen vive um personagem cheio de dilemas internos, cuja jornada de redenção é um deleite de se assistir. Ele começa o filme como um carrancudo macho-alfa racista e vai se transformando em uma pessoa cujos preconceitos e paradigmas vão sendo quebrados aos poucos.

Há doçura na sua ignorância, o que aos poucos vai encantando o pianista e o espectador.

Essa transformação é abraçada com unhas e dentes pelo ator. Ele está estupendo, na melhor atuação de sua carreira, com sotaque italiano e os vinte quilos a mais conquistados para dar veracidade ao papel.

Já Mahershala Ali percorre um caminho inverso, desconstruindo Don Shirley ao longo de 2h10minutos. Ele começa arrogante por não se encaixar nas expectativas da sociedade para um homem com seu talento e sua cor. Seu pedestal é sua defesa. Desce de lá quando aceita a si mesmo.
A química entre os dois atores é essencial nessa dinâmica, da qual Farrelly extrai um humor simples e certeiro.

O ser humano é complexo, mas seus desejos são simples – amor, reconhecimento, aceitação . E é aí que os dois encontram o caminho em comum para uma evolução que precisa ser
individual para ser tornar coletiva. Uma sociedade é conseqüência dos seus indivíduos, diz o filme nas entrelinhas.

A mensagem é alta e clara, mostrando como os negros sofreram– e sofrem – com o preconceito até hoje, e isso é sempre mostrado de maneira tocante. É na superação desses eventos que o filme consegue manter o sorriso no rosto do espectador, com um humor extremamente inteligente e irreverente usado pelos roteiristas.
Ao lado do diretor de fotografia, Farrely traz imagens belíssimas e transições sensacionais, deixando o longa com cara de filme de arte – na medida ideal para que a produção se destaque no Oscar 2019, com a promessa de levar várias estatuetas.
Sensível, perspicaz, dramático e repleto de tiradas irônicas e
hilárias, Green Book-O Guia é aposta certa.

Veja Também :

A Esposa

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Sementes Podres – Encara o mundo com humor e otimismo

Sementes Podres, apesar do nome, traz um otimismo quase
ingênuo para estes tempos em que vivemos dominados pelo
cinismo.
O ator, diretor e rapper iraniano-francês Kheiron dirige e
protagoniza a comédia dramática francesa, produção original da
Netflix que acaba de estrear na plataforma.

Kheiron aposta na compaixão e na paciência como formas de
educar crianças e adolescentes que têm tudo para tomarem
caminhos tortuosos.

No longa, o protagonista Wael, ainda menino viu toda a família
ser assassinada em um povoado qualquer do Oriente Médio.
Conseguiu escapar, sobreviver batendo carteiras e passando-se
por cego, até ser encontrado por uma freira que o leva para viver
em um orfanato. A história da infância de Wael é narrada ao
mesmo tempo em que sua vida presente, ao lado de Monique
(Catherine Deneuve), a freira que o salvou, agora ex-freira.

Ela ajuda a aplicar pequenos golpes até os dois serem pegos por um
senhor, Victor (André Dussolier), que conhece Monique há 30
anos. Victor tem uma instituição de apoio a adolescentes
problemáticos, e acaba empregando Wael como orientador de
um grupo.
Sementes Podres surpreende do começo ao fim. Nem mesmo
quando alguns clichês trazem um ritmo cômico para o longa, é a
mensagem por trás da história que contagia. Kheiron não apenas
é o protagonista perfeito, como realizou um excelente trabalho como roteirista.

O filme é leve apesar do significado denso que tem.


O roteiro explora os sentimentos de cada jovem, bem como de
seu novo mentor. Quando suas vidas se entrelaçam, percebemos
que há muito a fazer por aqueles que estão ao nosso lado.
Além da interpretação fantástica de Kheiron, temos também a
maior diva da França em um papel de coadjuvante perfeito para
ela: Catherine Deneuve. Deneuve, esplêndida como a mulher
que resgatou Wael durante a revolução Islâmica e o levou para a
França, cuidando dele com todo amor e carinho de uma mãe.

A sensibilidade de Kheiron é gigantesca e ele faz aqui uma de
suas melhores obras até o momento. Sementes Podres traz as
marcas das produções francesas, como a mistura da comédia
com drama, mas também tem elementos pessoais do autor, que
com bastante sutileza faz uma crítica ao modo de como as
pessoas vêem os imigrantes naquele país. O longa deixa a
certeza de que só o amor, a empatia e o conhecimento podem
triunfar sobre a vilania, a intolerância e a ignorância.
Temos aqui um bom filme, com tempero franco-persa de
Kheiron, resultando em 100 sólidos minutos de entretenimento
que comove, emociona e toca pela extrema sensibilidade.
Aqui fica a dica de um filme que realmente merece ser visto.

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